domingo, 8 de dezembro de 2013

DEPOIS DE LUCIA

NÓS ASSISTIMOS E NOS SURPREENDEMOS COM ESSE FILME, QUE NOS MANTEM LITERALMENTE COLADOS A POLTRONA E FAZ COM QUE NOSSA RESPIRAÇAO NAO SIGA O COMPASSO.

Tessa Ia em cena. Não há música no filme: cada gesto, cada movimento vem acompanhado apenas de seus próprios e pequenos barulhos - 

Depois de Lúcia, segundo filme do mexicano Michel Franco, recebeu o prêmio Um Certo Olhar, no Festival de Cannes, e teve cerca de 1 milhão de espectadores no México. O mais simples seria dizer que estamos diante de uma obra sobre assédio escolar, o tristemente famoso bullying. O próprio diretor reconhece que parte de seu processo criativo consistiu em entrevistar estudantes que sofreram a traumática experiência. No entanto, o longa se revela muito mais do que isso.

A história gira em torno de Roberto (Hernán Mendoza) e Alejandra (Tessa Ia), pai e filha, depois da morte de Lúcia, a esposa e mãe, num acidente de carro. Com o intuito de reconstruir a vida, os dois se mudam da litorânea Puerto Vallarta para a Cidade do México. Roberto é chef, e Alejandra, aluna do ensino médio. São o que se costuma definir como uma família pequeno-burguesa. Para a menina, o novo cotidiano se transforma numa sucessão de humilhações na escola, tão degradantes que podem causar insônia nos espectadores com filhos nessa faixa etária. É fortíssima, por exemplo, a cena em que os colegas a obrigam a comer um bolo de fezes, QUE NOS CAUSA UM IMENSO EMBRULHO NO ESTOMAGO.
Em diversos momentos da narrativa, fica difícil acreditar que uma pessoa – mesmo uma garota que acaba de perder a mãe e sofre chantagem – consiga tolerar semelhantes vexames sem se revoltar. Mas a realidade mostra que absurdos dessa natureza acontecem, e é o que Michel Franco parece querer dizer acima de tudo: a crueldade e a capacidade de tolerá-la na adolescência não conhecem limites.
 Seguindo rumos inesperados e uma direção eficiente Michel Franco, Depois de Lúcia se mantem com ótimo desenvolvimento e um roteiro vibrante, que ao lado de atuações convincentes tornam o filme  uma obra admirável do principio ao fim, pois é justamente em seu final que o filme reúne grandes motivos para ser chamado de uma imperdível obra prima.Trailer Aqui.


Vocação intimista
Sob o ponto de vista formal, Depois de Lúcia estabelece dois desafios que talvez exasperem o público mais convencional. O primeiro é o uso preponderante do plano fixo, um recurso que alcança excelentes resultados, especialmente nas cenas que se passam dentro de veículos. Numa delas, muito sugestiva, Roberto desce do carro e a câmera – parada no interior do automóvel – não exibe o que ocorre na rua, criando a ilusão de um ponto cego e nos fazendo pensar em como se deu o acidente de Lúcia. O segundo desafio é a ausência de música: cada gesto, cada movimento vem acompanhado somente de seus próprios e pequenos barulhos.
O resultado é uma narrativa tensa do princípio ao fim, que produz uma sensação permanente de angústia. Um drama que ameaça virar thriller, mas que não o faz porque nunca abdica de privilegiar sua vocação intimista.
O mexicano Juan Pablo Villalobos é autor do romance Festa no Covil.
O filme: Depois de Lúcia, de Michel Franco. Com Hernán Mendoza, Tessa Ia, Gonzalo Vega Jr. e Tamara Yazbek. Estreia neste mês.

Nenhum comentário:

Postar um comentário